Um dos principais mandamentos da festa de Sucot diz respeito às Quatro Espécies: Lulav, Etrog, Hadáss e Aravá. Cumprimos esse mandamento porque a Torá assim nos ordena. O fato de entendermos a razão para o seu cumprimento – e por que devemos reunir e segurar essas quatro espécies – tem importância secundária. A importância primária é a percepção de que fazê-lo é cumprir a Vontade de D-us.
No entanto, a Torá nos estimula a descobrir o significado de seus mandamentos. A raiz da palavra Torá é Hora’á – ensinamento. Cada passagem, lei e mandamento da Torá oferece ensinamentos atemporais e universais.
O mandamento das Quatro Espécies de Sucot é um dos mais enigmáticos no Judaísmo. No entanto, transmite muitas lições, especialmente à luz dos ensinamentos do Midrash sobre o simbolismo de cada uma das espécies.
Segundo o Midrash, o Lulav – a folhagem fechada da palmeira, que é a mais alta das quatro espécies – simboliza o estudioso da Torá: o judeu que passa a maior parte de seu tempo estudando os livros sagrados. Essas pessoas geralmente levam uma vida isolada: passam a maior parte de seu tempo na sinagoga, na ieshivá e nas escolas – estudando e ensinando Judaísmo. Como a maior parte de seu tempo, energia e recursos são dedicados a estudar e a ensinar a Torá, eles muito dificilmente deixarão sua Torre de Marfim para realizar um grande número de boas ações. Pouquíssimos dentre eles têm os recursos financeiros para promover grandes atos de benemerência. Muito raramente o rabino de uma sinagoga é quem a mantém financeiramente.
É muito raro que um grande erudito em Torá tenha os meios de fundar e financiar escolas e ieshivás, de doar grandes somas a hospitais e refeitórios públicos. Muitos desses eruditos nem passam muito tempo rezando: sua missão na vida é absorver o máximo possível da Torá – a Vontade e a Sabedoria Divina – para depois transmitir o que aprenderam por meio de palestras, livros e aulas.
Vale ressaltar que nem todos os judeus personificados pelo Lulav são iguais: um pode ser um grande Sábio e Cabalista, enquanto outro pode ser um professor. Mas, essencialmente, todos eles estão engajados na mesma atividade: por meio de seu estudo, servem de canal para trazer à Terra a Sabedoria Divina, ajudando, assim, a difundi-la entre outros.
O Hadáss – ramo da árvore de murta – é outro elemento das Quatro Espécies. De certa forma, é a contraparte do Lulav: um possui o que falta ao outro. O Hadáss representa o judeu que não tem tanta inclinação intelectual ou que simplesmente é muito ocupado para passar horas a fio estudando a Torá. Personifica os judeus que são homens de ação: líderes comunitários, jornalistas, empresários, profissionais, filantropos e ativistas. É raro encontrarmos pessoas desse tipo que tenham tempo de passar muitas horas estudando a Torá. Eles são muito ocupados trabalhando ou realizando boas ações para poderem passar dias e noite estudando o Talmud ou mergulhando nos segredos da Cabalá. O Hadáss é o judeu que se ocupa ajudando os demais. Ele pode ser um médico que salva vidas, um cientista que pesquisa a cura das doenças, o soldado que ajuda a proteger os cidadãos de Israel ou o empresário que fornece produtos ou serviços que melhoram nosso mundo. A maioria dos judeus se enquadra nessa categoria. Não importa se a pessoa faz um pequeno donativo mensal para os necessitados ou doa e subsidia sinagogas, escolas e hospitais – se é membro do governo de Israel ou líder de um clube judaico local. O que importa é que a pessoa doa seu tempo ou seus recursos em benefício de outros seres humanos.
O Etrog – a cidra amarela, outra das Quatro Espécies – representa o judeu que é um erudito em Torá e um homem de grandes feitos. Tais pessoas são muito raras, mas existem. O Rabi Yehudah HaNassi, conhecido no Talmud como Rebi, foi o maior erudito de sua geração. Foi quem transcreveu a Mishná, resumo da Torá Oral. Ele também era o homem mais rico de Israel e amigo íntimo do imperador romano, à época, Marco Aurélio Antonino. Rebi passava seus dias estudando e ensinando a Torá – e ao transcrever aMishná, garantiu que a Torá Oral nunca se perdesse. Ao mesmo tempo, Rebi usou sua fortuna e influência para melhorar a vida do Povo Judeu, cujos membros viviam na Terra de Israel sob ocupação romana.
Rabi Yehudah HaNassi foi um homem singular na História Judaica, mas houve e há algumas pessoas extraordinárias que foram abençoadas com os poderes intelectuais e espirituais de se tornarem eruditos em Torá e com os recursos financeiros para realizar grandes atos de benemerência. A Torá chama o Etrog de um belo fruto, e pode-se compreender por que: a pessoa que é tanto um estudioso quanto um líder comunitário é uma bela pessoa, completa.
A quarta espécie é o Aravá – um ramo folhoso do salgueiro. Representa o judeu que não é um estudioso nem tampouco um líder ou benfeitor – alguém que não tem riqueza espiritual nem material. Enquanto as três outras espécies representam judeus que possuem e doam algo de si – sabedoria, riqueza ou influência – o Aravá representa aquele que não dispõe desses atributos e, portanto, necessita recebê-los de terceiros. Aparentemente, o Aravá é o oposto do Etrog.
À primeira vista, ninguém ia querer ser um Aravá e todos gostariam de ser um Etrog. No entanto, na falta do Aravá, o mandamento das Quatro Espécies não pode ser cumprido. Essa espécie não pode ser substituída por nenhuma das outras. Podemos possuir osEtroguim mais belos e um lindo campo de Lulavim e de Hadassim de onde escolher, mas se faltar o Aravá, não podemos cumprir o mandamento da Torá.
Deve-se notar, também, que a bênção feita sobre as Quatro Espécies menciona não o Etrog, mas o Lulav: termina com as palavras “al netilat Lulav”, e não “al netilat Etrog”. Em vista do que dissemos acima, seria de esperar que o Aravá fosse desnecessário para o cumprimento do mandamento e que a bênção fosse feita sobre o Etrog, que representa o judeu em sua totalidade. Por que, então, é o Aravá uma das Quatro Espécies e por que é necessário para o cumprimento da mitzvá? E, ainda, por que a bênção menciona oLulav e não o Etrog? As respostas a essas perguntas nos ensinam importantes lições sobre o judaísmo e sobre como nos devemos relacionar com outros judeus.
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